O bobo, por não se ocupar
com ambições, tem tempo para ver, ouvir, tocar no mundo.
O
bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado
por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo, estou pensando”.
Ser
bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de
sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem
a idéia.
O
bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão
sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e
estes os vêem como simples pessoas humanas.
O
bobo ganha utilidade e sabedoria para viver.
O
bobo parece nunca ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um
Dostoievski.
Há
desvantagem, obviamente. Um bobo, por exemplo, confiou na palavra de uma desconhecida para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o
aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é
fresco. Vai o bobo e compra o aparelho sem vê-lo sequer.
Resultado:
não funciona.
Chamado
um técnico, a opinião deste era que o aparelho estava tão estragado que o
concerto seria caríssimo: mais vale comprar outro.
Mas,
em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e,
portanto estar tranqüilo.
[...]
É
que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.
LISPECTOR,
Clarice.
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